
Num pátio azul
Nuvens brincam de se reinventar
Se transformam
Mudam a forma,
talvez a textura,
quem sabe a densidade.
Uma baila feito um pássaro
Outra se arrasta como um dinossauro
Outras se sucedem como ondas de um mar calmo
E ainda como ondas do mar,
se chocam e choram a chuva.
Mas aquele menino mira o céu
E com espanto descobre os segredos das nuvens
Que brincam de vir a ser o ser que querem ser
Por ter apenas a incompletude de si...
E o menino se percebe sem mundo ter,
Inquieto por não ter o que...
Sem ser pássaro, nuvem ou água,
Sonha em também poder se inventar,
transmutar a realidade fria,
e mesmo descalço com o pé no chão,
no chão de um mundo em que ele simplesmente possa ser...
e assim tomar impulso e voar
Mais alto que as nuvens, suas guias.
Roubando palavras:
“Digo adeus a ilusão
mas não ao mundo.
Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
da humilhação,
da tortura,
do terror,
retiramos algo
e com ele construímos um artefato
um poema
uma bandeira.”
Ferreira Gullar